A TRAVA DOS JUROS
- Amir Khair
- 17 de jul. de 2017
- 3 min de leitura
É usual nas análises da conjuntura fazer-se referência a uma variável - que tem papel relevante nos resultados fiscais, na inflação, crescimento econômico e câmbio -, que é a taxa de juros da economia.
O que é interessante observar é que a taxa usada é a Selic. Mas existem duas taxas com funções distintas. Uma é a Selic: a taxa básica, definida pelo governo; outra, a de juros cobrada pelo sistema financeiro. No caso do cheque especial (355% ao ano) é 14 vezes maior que a Selic (10,25%).
A diferença entre elas é denominada de "spread", cuja maior parte é o lucro do sistema financeiro nas operações de empréstimos. Em junho último, o spread para a pessoa física estava em 132% e, para pessoa jurídica, 60%. No mundo gira entre 3% e 5%. Vejamos os efeitos dessas duas taxas sobre a economia.
A Selic afeta:
a) o DÉFICIT FISCAL, pois incide sobre a dívida do governo, determinando as despesas com os juros e o custo de carregamento das reservas;
b) o CÂMBIO, ao atrair capital especulativo internacional;
c) as CONTAS EXTERNAS, pois, ao apreciar o real, reduz as exportações e eleva as importações, além de estimular a saída de dólares no turismo e a remessa de lucros e dividendos; e
d) a LIQUIDEZ: ao atrair os dólares eleva a disponibilização de recursos aos bancos para empréstimos, o que vai contra o objetivo de redução da demanda para controle da inflação.
Os juros bancários afetam:
a) o CONSUMO, ao influir no valor global a ser pago nas compras;
b) o INVESTIMENTO das empresas para as decisões de assumir riscos para a expansão das vendas e o capital de giro necessário para viabilizar o fluxo de caixa;
c) a INADIMPLÊNCIA, ao influir no valor das prestações a serem quitadas; e
d) o LUCRO do sistema financeiro, pela essência do seu negócio.
QUAL É O PROBLEMA?
Devido à política monetária adotada pelo Banco Central (BC), o Brasil tem a particularidade de ter, ao mesmo tempo e a vários anos, essas duas taxas de juros como as mais elevadas no ranking mundial.
QUAL É A TRAVA?
Nesses níveis anormais, essas duas taxas travam o desenvolvimento natural macroeconômico e impedem o País de avançar de forma saudável, pois elevam as despesas do governo, das empresas e dos consumidores, distorcendo a concorrência e agravando a distribuição de renda, além de deslocar valores da economia real e do governo para o sistema financeiro, etc.
AGIOTAGEM
É difícil entender como essas anomalias possam contar com o apoio da maioria das análises de conjuntura que defendem mais elevação dessas taxas para controlar a inflação. Países de economia semelhante têm taxas muito inferiores e com inflação igual ou menor que a nossa. Podemos afirmar que somos, infelizmente, o paraíso da agiotagem legalizada!
QUEM PAGA?
É o Copom que acaba por definir a Selic, que é indicada pelo mercado financeiro. Quanto mais elevada, maior é o lucro do sistema financeiro. Esse lucro sai do Tesouro Nacional, pois o governo federal é o único devedor dos títulos vinculados à Selic e a conta é paga pelo contribuinte por meio dos tributos.
PREJUÍZO
Os juros atingiram, nos últimos 12 meses até maio, R$431bi (6,8% do PIB) - quando, no mundo, é de 1,8% do PIB. A perda de 5% do PIB (5,7 menos 1,8) é dinheiro jogado fora.
FALTA DE RECURSOS
Com uma despesa tão elevada com juros, não sobram recursos para o governo expandir e dar qualidade na área social ou da segurança pública, menos ainda para investir em equipamentos voltados à expansão dessas atividades e à infraestrutura do País.
Esse problema é antigo. No governo FHC (1995/2002), os juros atingiram a cada ano em média 8,6% do PIB, no governo Lula (2003/2010) 6,2%. Foram R$ 6 trilhões(!) em valores atuais entregues ao mercado financeiro nos últimos 15 anos. Caso o BC não tivesse trilhado esse caminho de operar com a Selic elevada, o País seria outro, com situação fiscal equilibrada. E teríamos zerado o elevado déficit social e de infraestrutura existente.
Como o governo não interfere no BC, fica obrigado a obter resultados primários (receitas menos despesas, exclusive juros) elevados para pagar apenas parte dos juros, resultando em déficits fiscais e dívida crescente.
É uma bola de neve, que continuará a rolar ladeira abaixo caso não caia rapidamente a Selic e os juros bancários, que travam o desenvolvimento em prol da agiotagem.




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